Post-it.

where the crazy matters

11/02/2016

Hora De Óbito: 21:30H

Quando eu disse que este era o ano em que ia começar finalmente a fazer coisas, começar a matar os meus animais de estimação não estava nos meus planos.
Mas foi o que eu fiz. Ontem matei-te, Lil.
Desculpa. Não consigo parar de te pedir desculpa. Foi a última coisa que te disse antes de nunca mais te ver.
"Fizeste tudo o que podias", "não te podes culpabilizar", "estás a fazer a coisa certa", "é o melhor para ela". Não percebo por que é que toda a gente se esforça por me fazer sentir bem em relação a isto. Eu tenho que me sentir mal. Tu eras responsabilidade minha, eu prometi tomar sempre conta de ti e fazer tudo por ti para que tivesses a melhor vida possível. "Fizeste tudo o que podias". Tretas. Eu não fiz nada. A única coisa que eu fiz foi consentir que te metessem aquele líquido azul na veia.
Não páro de repetir o dia de ontem na minha cabeça. Tu sem reacção, eu a dar-te comida com a seringa, tu a deixares cair tudo para cima das minhas calças, limpar as calças, dar-te duas injecções, comer meia sandes de queijo, meter-te na transportadora, tu sem reação, a viagem de autocarro, tu sempre sem reacção eu a tentar não chorar, preparar-te a box no hospital, pôr-te na box, o saco de água quente, mudar-te de box, tirar-te da box, segurar-te enquanto te põem o catéter, deixar-te mexer, rapar a outra pata, preparar o sistema de soro, colocar-te novamente na box e deixar-te lá, sempre sem reacção.
Ir trabalhar, desesperar por notícias, finalmente tê-las, ouvir "prognóstico reservado" e "estado depressivo muito avançado", "não há muito mais que se possa fazer para além do que já está a ser feito". Eu ouvi aí que tu ias morrer. Eu soube aí.
Mas é quando te vejo outra vez ao final do dia, ainda pior que de manhã - quando eu achava que isso não era possível - e depois quando chegam os resultados das análises, o "oh Sílvia não são nada boas notícias", o "é PIF" aí eu soube que tu não ias morrer. Eu é que tinha de te matar. E decidi isso depois de perguntas básicas e de um "está bem, só um bocadinho."
Estou já tão arrependida. Desculpa não ter lutado mais por ti. Devia ter-te dado pelo menos mais um dia. Desculpa ter desistido logo e ter consentido logo.
Eu sei que tu já não "estavas cá"... ainda assim.


Desculpa, desculpa, desculpa, desculpa.
Não me consigo mentalizar que nunca mais te vou ver e dar abracinhos. Que nunca mais vamos brincar e dormir juntas. Que nunca mais vais ronronar para mim. Que nunca mais vais correr quando ouves uma lata a abrir ou a porta do frigorífico. Que nunca mais vais raspar com as patas em todo o lado. Que nunca mais vais ter comigo quando o despertador tocar. Que nunca mais te vais sentar e dar-me as patinhas quando eu peço. Que nunca mais vais estar à porta à minha espera quando eu chego a casa. Que nunca mais vais ser a primeira coisa que eu abraço e mimo quando chego a casa. Que nunca mais há mais Lil.


Foste uma gatinha única e especial. A melhor, a gata mais fixe do mundo - como eu não parava de te gabar a quem perguntasse.
Não tive sequer direito a dois anos contigo, Lil. Tu não merecias isto. E eu também não...

Lil.
Lilocas.
Lilocas Pipoca.
Pipoquinhas.
Lilinda.

"Desculpa" foi a última coisa que eu te disse mas "amo-te" foi a última que tu ouviste.
Amo-te.

















Para sempre.


Sílvia.

19/11/2014

Por Que É Que Não Esperaste?

Sou mesmo uma actriz do caralho. Sou mesmo.
Conversas banais, cordiais. Mas não sobre os meus olhos inchados. Nunca sobre os meus olhos inchados.
Quanta simpatia. Quanta alegria. Como se fosse um dia normal. Como se não estivesse a morrer por dentro.
Só a voz denuncia algo de errado: constipação.
- Então Sílvia, estás bem? Epá estás muita constipada.
- Um bocadinho.
- Um bocadinho não: um bocadão!
Sim. É isso mesmo. Hoje, 19 de Novembro de 2014, foi o dia mais difícil de suportar de toda a minha vida. E passou por uma constipação.

Hoje, 19 de Novembro de 2014, o meu cão morreu. Corrijo: uma parte de mim morreu.
O Chopin morreu. E é para Ele que escrevo a partir de agora:


O resto da tua família já estava mentalizada para isto. O resto da tua família já aceitara que isto aconteceria "mais dia, menos dia". Mas eu não.
Eu nunca me deixei acreditar. Para mim era uma possibilidade muito remota. "Não, isso não vai acontecer. Ele ainda chega aos quinze. Vão ver." E eu é que vi. Perdi a merda da aposta mais importante da minha vida.
Imaginei muitas vezes como seria perder-te, imaginei que chorava muito (e chorava muito enquanto imaginava) e tentava convencer-me de que um dia tinha de ser.
E agora aconteceu e eu chorei, Pan. Ainda estou a chorar e não há meio de parar. Já nem sinto a cabeça de tanto que me dói.
Foste o melhor cão do mundo. Já sei, toda a gente diz isso. Mas tu foste! E nunca nenhum outro há-de igualar-se a ti. Tu tinhas personalidade. Forte. Só fazias o que querias! E ainda bem, tenho tantas histórias tuas para contar!
Nasceste um rebelde e acabaste na coisa mais meiga deste mundo. Eu não acredito que não há mais Chopin. Eu não acredito que nunca mais te vou dar abracinhos. Eu não acredito que não vou voltar a dar-te os biscoitos que estão em cima do frigorífico. Eu não acredito que não vou ver mais esse queixinho a tremer de tanto mimo! Eu não acredito. E tanto que me dói.
Eu estive aí perto, no fim-de-semana passado, sabes? E não fui ver-te! Fazes ideia de como me sinto por isso? Soubesse eu que era o teu último fim-de-semana... cabra estúpida! Desculpa.
Matava-me sempre deixar-te para trás. Eu pedia-te sempre que esperasses mais duas semanas e dizia que te amava muito. Num sussurro para mais ninguém ouvir. Só nós dois.
E tu esperaste sempre. Por que é que não esperaste desta vez?
Sabes, é que eu sempre tive esta fantasia de que estaria aí contigo. Que perceberia o quando e abraçava-te enquanto ias... Por que é que não esperaste?
E agora nunca mais te vou ver na vida.
Dava tudo para ter sabido quando. Dava tudo para ter estado contigo. Desculpa não ter estado contigo!

Gosto tanto de ti, Pan! Vou ter tantas saudades tuas! Aquela casa sem ti não faz sentido...



















Para sempre.


Sílvia.

23/11/2013

Ontem Houve Uma Pessoa Que Quase Se Matou Lá Onde Eu Trabalho

Essa pessoa fui eu.


11 da manhã, hora feliz, hora da pausa. Lá vai a Sílvia toda contente, os seus dois amiguinhos já saíram antes dela.
Quando alcança o último lance de escadas, vê que a sua amiguinha está à porta à sua espera. Sorri para ela.

Depois a Sílvia só se lembra de que, por alguma razão e em determinado ponto, o chão começou a andar para trás, o mundo perdeu o sentido e a Sílvia perdeu o norte.
Voltas no ar, uma dor aqui, outra ali, oito degraus e o baque final da cabeça a bater no chão. Merda, pensou a Sílvia. E levantou-se no segundo a seguir para ter a certeza de que não tinha morrido.
Com a mão na cabeça, a Sílvia olha para a amiguinha e diz:

- Não faço ideia do que acabou de acontecer.
- Mas estás bem?
Pausa enquanto pensa - Epá, ya.
E depois a Sílvia riu-se muito.

Senhor Segurança, com os olhos muito abertos: O que é que aconteceu?
Sílvia, a rir-se muito: Bati com os cornos no chão! Ahahah
Senhor Segurança, a rir-se muito: Mas estás bem?
Sílvia, a rir-se muito: Yaaa!
Amiguinha, a rir-se muito: Disseste "ai, ai, ai" enquanto caías.
E continuaram todos a rir muito, e a Sílvia voltou a fazer chamadas com um saco de gelo enrolado num paninho cor-de-rosa.

Depois contaram à Sílvia uma história sobre uma pessoa que tinha batido com a cabeça, ficado com hematomas, quistos, sangue pisado e ovos mexidos dentro da cabeça e foi operada muitas vezes e nunca mais tinha ficado bem e a Sílvia, maricas como é, foi a correr para o hospital onde ficou toda a tarde para, às oito da noite lhe dizerem que "felizmente está tudo bem" - chocante.

E depois a Sílvia foi para o IMAX do Colombo, ver a pré-estreia do Catching Fire.
Portanto, no final das contas, a Sílvia pode dizer que foi um bom dia.


Sílvia.